Em homenagem a Walter Benjamin

Se ao mundo predissesses teu morrer,
o próprio ser roçaria docemente o corpo,
e saberias que o tempo é floresta de alheamento,
e que as estrelas medem o espesso muro do ser.
E que o silêncio sela a alva estilhaçada,
que parda sobe mar acima, e envolve os múltiplos
horizontes do ver, em que os olhos tocam as coisas
e em que as palavras põem os nomes, dando sentido
a tudo, enquanto a luz do mar azul revela que está
escrito o destino de todos a ser.

Dir-te-ia, mulher, que então está a vibrar na boca
o texto e o silêncio,
as palavras a ser, e uma espécie de ternura que nos
abrange, com os três filhos a alumiar
a vida transfigurada em venturosos días;
é então que sabemos que as coisas sem nome tambén
são, e que a palabra nutre o sentido de ser.

Tu sabes já do som que vem das altas colinas do sentir,
e que nas asas do vento há mar livre, e que
eu Ulisses venho de rotas ignotas porque sei que teu
sentir não emudeceu; acordam as aves e cantam e a luz
calada e escondida se faz de dia e alerta da Pátria
ainda amordaçada.

Moras, como eu, amada, no verbo e repartes pero corpo
mudo amor a marido e filhos, pátria e humanidade; e no
alto mar vês que se encapela a vida e que as horas não
são indugentes, senão parte da nossa sina de ser de
tempo e vida.
Resta no olhar o amor e as sombras, e o sentir o pensar
Na alva fria, e há algo que nos abraça, como tempo
Perdido ou sina de ser, pátria e vida, e aindaa estirpe
Que nós continua na Galiza viva.

Disposta a dar amor, tenrura de ser, sabes, que se adensa
o tempo cada día; e que há partida em que o teu corpo se
cinzela com alma minha; e vás a mim como homem que
cura a tua ânsia perdida; quando o ser sabe já do destino
do viver, de morte e vida.

Para Adela Figueroa Panisse.